Parceria do Departamento de Química do CTC/PUC-Rio com o Instituto Perene avaliou fogões a lenha no Recôncavo Baiana e confirmou riscos para a saúde

Pesquisa do Departamento de Química do CTC/PUC-Rio, feita na Bahia em parceria com o Instituto Perene, indica riscos dos fogões a lenha para a saúde cardiorrespiratória

Concentrações de poluentes em residências rurais na Bahia ultrapassam limite da Organização Mundial de Saúde

Em um estudo inédito no Brasil, o Departamento de Química do Centro Técnico Científico da PUC-Rio (CTC/PUC-Rio) avaliou a qualidade do ar durante a queima de lenha em fogões rudimentares no Recôncavo Baiano. A pesquisa foi viabilizada pelo projeto Fogão do Mar, realizado pelo Instituto Perene com o patrocínio da Petrobras e também contou com bolsas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj). O estudo é liderado pela coordenadora do Laboratório de Química Atmosférica (LQA) do CTC/PUC-Rio, Profa. Dra. Adriana Gioda, pelo mestrando Luiz Felipe da Silva e pelo pós-doutorando Dr. Alex Ruben De La Cruz.

Os resultados preliminares apontaram que as concentrações médias de partículas tóxicas variaram de 100 a 300 microgramas por metro cúbico (µg m-3) nas cozinhas durante as 8h em que os fogões estavam acesos. Em alguns momentos, os níveis extrapolaram o limite máximo do equipamento, sendo maiores que 1000 µg m-3. De acordo com as novas diretrizes da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2021, os limites recomendados são de 15 µg m-3 (24 h) e 5 µg m-3 (anual) para material particulado (PM2.5) e 45 µg m-3 (24 h) e 15 µg m-3 (anual) para material particulado (PM10).

Se for considerado que os usuários desse tipo de fogão fazem uso do mesmo pelo menos cinco vezes na semana por 8h, os níveis de poluentes a que estão expostos ao longo são altíssimos. “Essa exposição leva a doenças não transmissíveis, incluindo acidente vascular cerebral (AVC), doença cardíaca isquêmica, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e câncer de pulmão”, afirma Gioda. De acordo com a OMS, a poluição pela queima de lenha nos fogões rudimentares foi responsável por cerca de 3,2 milhões de mortes em 2020, incluindo mais de 237.000 mortes de crianças menores de 5 anos de idade.

O uso de fogões a lenha tem aumentado em vista da crescente crise econômica brasileira. O alto custo do gás de cozinha (GLP) tem motivado famílias de baixa renda a utilizarem a madeira como combustível para a cocção de alimentos. Conforme dados do Ministério do Meio Ambiente (MMA), cerca de 85% das famílias das zonas rurais do Nordeste fazem uso da lenha.

Fogões ecoeficientes 

Para enfrentar esse problema, o Instituto Perene, por meio do projeto Fogão do Mar, entrega em comunidades rurais do Recôncavo Baiano, os fogões ecoeficientes. Um fogão a lenha feito em alvenaria e que garante uma maior conservação de calor, gerando uma combustão mais eficiente e reduzindo o consumo de lenha. O produto, além disso, vem equipado com uma chaminé que elimina grande parte da fumaça para fora da casa. O projeto já entregou cerca de 2.400 fogões em comunidades dos municípios de Cachoeira e Maragogipe, Bahia, e até o final do ano serão entregues 2.800. 

Os fogões ecoeficientes são uma etapa de transição para fogões e combustíveis com menores emissões, como é o caso do gás de cozinha (GLP). No entanto, o alto custo do GLP, atualmente associado à crise econômica, tem dificultado essa mudança. Vale ressaltar que a transição energética faz parte dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas a serem atingidos até 2030. 

Próxima etapa da pesquisa

Como parte do projeto Fogão do Mar, a segunda etapa da pesquisa vai realizar uma nova avaliação da qualidade do ar nas mesmas residências, após a instalação dos fogões ecoeficientes. Espera-se ter uma redução dos níveis de poluentes nas cozinhas em torno de 50%. O estudo do Departamento de Química do CTC/PUC-Rio venceu o prêmio de melhor apresentação na categoria Ambiental, do XVIII Encontro Regional de Química, da Sociedade Brasileira de Química (SBQ), da Secretaria Regional do Rio de Janeiro. 

Para o diretor do Instituto Perene, Guilherme Valladares, a pesquisa poderá mostrar um problema ainda muito carente de políticas públicas para enfrentá-los. “Trouxemos essa pesquisa para dentro do projeto, porque acreditamos que ela poderá evidenciar o que vemos na prática há anos: uma grande parcela da população que ainda está sujeita aos graves riscos do uso de lenha sem que a busca de soluções seja colocada em pauta pela sociedade com a relevância necessária. A parceria com a PUC-Rio vai nos ajudar a evidenciar os fatos”, afirmou. 

Mudanças climáticas 

O fogão ecoeficiente, ao reduzir o uso da lenha, reduz também o volume de fumaça emitida e, com isso, a emissão de gases do efeito estufa causadores do aquecimento global. O projeto Fogão do Mar, com a difusão dos fogões ecoeficientes, está aliando os cuidados da saúde humana com o os cuidados ao meio ambiente. “O uso de lenha não afeta apenas a saúde, mas também o clima. Uma redução no uso de lenha ajuda a mitigar a emissão de gases de efeito estufa causadores do aquecimento global”, ressalta Gioda. 

segunda-feira, 17 de outubro de 2022
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