Departamento de Química da PUC-Rio e Fiocruz alertam para alto nível de arsênio e outras substâncias tóxicas em peixes do litoral do Rio de Janeiro

Pesquisa do Departamento de Química do CTC/PUC-Rio em parceria com a Fiocruz aponta alto nível de arsênio e outras substâncias tóxicas em peixes do litoral do Rio de Janeiro 

Os níveis chegam a ser 79 vezes acima do que o tolerado pela OMS  

Um estudo em andamento realizado por pesquisadores do Departamento de Química do Centro Técnico Científico da PUC-Rio (CTC/PUC-Rio) em parceria com a Fiocruz revelou que tubarões e raias encontrados no litoral da região metropolitana do Rio de Janeiro estão contaminados com altíssimas quantidades de arsênio e diversos contaminantes orgânicos tóxicos. Exemplares de raia-viola capturados ao longo de Ipanema e Copacabana, perto das Ilhas Cagarras, chegaram a apresentar níveis de contaminação por arsênio equivalentes a 79 mg/kg de carne, sendo que o máximo permitido pela ANVISA é de 1 mg/kg de carne, enquanto a OMS, que havia estabelecido o mesmo limite, recentemente retirou o limite seguro deste elemento e agora considera que qualquer quantidade ingerida de arsênio não é segura. Em espécimes de raia-manteiga, muito comuns no litoral carioca, a concentração de arsênio chegou a 58 mg/kg. Ambas as espécies são vendidas sob o termo genérico "cação" e são muito populares na culinária carioca. Além disso, a carne de "cação", que pode na verdade ser qualquer espécie de tubarão ou raia, é também servida a crianças e adolescentes estudantes de escolas públicas de ensino do Rio de Janeiro, indicando potenciais riscos à Saúde Pública, através do consumo da carne destes animais. 

De acordo com os resultados, os compostos orgânicos encontrados nos peixes incluem hidrocarbonetos oriundos de derramamentos de petróleo e queima de combustíveis, o metabólito diclorodifenildicloroetileno (DDE) do agrotóxico diclorodifeniltricloroetano (DDT), bifenilas policloradas (PCB) usadas em diversos processos industriais e éteres de difenila polibromados (PBDE) utilizados na fabricação de retardantes de chamas. "O DDE foi encontrado em concentrações de até 40 mg/kg na carne desses peixes, e os valores dos demais contaminantes ainda estão sendo averiguados. Todas essas substâncias, incluindo o arsênio, são persistentes no meio ambiente e tendem a se acumular com o tempo", revela o Prof. Renato Carreira, do Departamento de Química do CTC/PUC-Rio. 

A pesquisadora Dra. Rachel Ann Hauser-Davis, da Fiocruz, acrescenta: "A maioria das substâncias detectadas são tóxicas, carcinogênicas e mutagênicas, podendo alterar o sistema imune, afetando inclusive taxas de reprodução e crescimento de organismos expostos e prejudicando o desenvolvimento dos fetos. Além disso, elas são facilmente transferidas a ovos de animais e também a embriões, tanto humanos e animais, ainda no útero. Assim, as proles já nascem contaminadas, levando a riscos ecológicos significativos". 

A contaminação é causada pelo lançamento de esgoto doméstico e industrial, aplicação de pesticidas na agricultura, descarte inadequado de lixo sólido, em especial, equipamentos eletrônicos, uso de combustíveis fósseis e derramamentos de petróleo. "O arsênio ocorre naturalmente na geoquímica de ambientes aquáticos, mas é muito difícil encontrá-lo em concentrações tão elevadas, indicando uma fonte de contaminação desconhecida", ressalta a Profª Tatiana Saint'Pierre, do Departamento de Química do CTC/PUC-Rio.  

Segundo os pesquisadores do estudo, os resultados indicam problemas crônicos nas áreas de coleta, o que aumenta o risco de crises de Saúde Pública, desequilíbrios ecológicos, declínio de estoques pesqueiros e possível extinção de espécies marinhas já altamente ameaçadas, como os tubarões e as raias. 

Os animais foram coletados em 2021 e analisados no final de 2021 e início de 2022. "Contudo, as coletas são contínuas e ainda há muitos animais de diferentes espécies em processo de análise", reforça Hauser-Davis. Ela alerta ainda que "programas de monitoramento contínuo de contaminantes, não apenas em pescados, mas em todos os compartimentos ambientais, são insuficientes, e pesquisas científicas são a forma mais eficaz de alertar a população sobre os riscos".  

Os estudos das equipes começaram em 2019 com apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) e, hoje, contam com fomento do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO), em parceria também com outras importantes instituições brasileiras, como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Universidade Estadual Paulista em Franca (UNESP), Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro (FIPERJ), Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF) e o instituto de pesquisa do AquaRio (IMAM), e internacionais, como a Florida International University.   

terça-feira, 4 de outubro de 2022
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